Coleção ‘Fala, Helipa!’

Tallyta Pavan
4 min readMay 18, 2021

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Parte 1/3 — A rádio comunitária

Meios de comunicação impactam na socialização da comunidade e em seu desenvolvimento

Photo by Danilo Alvesd on Unsplash

O brasileiro pode usar diferentes caminhos para chegar até as notícias: ouvindo uma estação de rádio, lendo um impresso, assistindo aos telejornais, acessando sites ou até mesmo assinando uma newsletter do veículo para receber as notícias via WhatsApp. Heliópolis, bairro da cidade de São Paulo com 180 mil habitantes, abriga histórias que precisam ser contadas.

Veículos como a ‘Rádio Comunitária Heliópolis’, o jornal ‘UNAS Heliópolis e Região’ e a revista ‘Q Fita É Essa?!’, desenvolvem um serviço para integrar e contar essas histórias. Estes veículos são necessários para atender a demanda de uma população que ainda vive sobre a escassez de não possuir acesso a tecnologias avançadas.

O propósito dos colaboradores desses meios é fazer com que o mundo chegue dentro da comunidade. “A comunicação tem essa missão de destravar, de sensibilizar e de informar. Com esse objetivo, entra o trabalho dessa galera”, diz Sylvio Ayala, editor da revista comunitária.

Diego Rocha, comentarista nos programas Bairro Educador e Estilo Musical, reforça que o público que é esquecido pela sociedade corre para esses veículos, pois sabe que encontrará espaço para contar suas histórias, fazendo disso um instrumento para as comunidades se expressarem.

Para o colaborador, a única coisa que divide as comunicações são suas finalidades. Enquanto a comercial vislumbra o dinheiro (como já diz o nome: ela está comercializando), a comunitária busca apenas dar voz à população.

A RÁDIO DAS CORNETAS

“Está vendo aquelas três cornetas ali? Foi assim que começou”, nos explica Liberalino Lima, coordenador de programação da Rádio Comunitária Heliópolis, apontando para os postes da Rua Paraíba. Em sua fundação, há 27 anos, o objetivo da rádio era apenas manter os moradores informados sobre reuniões importantes. As cornetas espalhadas foram a solução para melhorar os problemas de comunicação.

Após muita luta e investimentos estrangeiros, a rádio se modernizou e foi ao ar pela primeira vez. Atualmente, está sintonizada na frequência 87,5 FM. O sinal atende apenas as regiões próximas ao bairro, porém, toda a programação é transmitida em tempo real por meio do site oficial. “Com a internet, isso chega ao mundo todo. Já recebi ligações do Japão, Portugal e muitos outros países alcançados pela internet”, diz Lima.

> Programação

Liberalino foi escolhido para coordenar a programação, pois passa grande parte de seu tempo ouvindo a 87,5 FM. A grade começa às seis horas da manhã e termina às dez da noite. Cada um dos programas possui duas horas de duração, englobando diferentes públicos, desde a velha guarda até os amantes do rap. “Fazemos uma programação variada porque a rádio é isso, você precisa agradar todo mundo: o jovem, o velho, a criança”, explica o coordenador. Através dessa programação, a rádio também cumpre uma função social.

De acordo com Renato Rodrigues, locutor do programa Frequência do Sucesso, a programação não é feita sozinha, ela é fruto de um conjunto de decisões tomadas em reuniões de pauta. “A nossa obrigação é passar informativo para a nossa comunidade e regiões, não é disputar IBOPE com as grandes rádios”, diz o apresentador.

O que é unânime entre os locutores é a certeza de produzirem um trabalho acessível ao povo. “O público pode ligar para cá, é liberado. A vantagem de você trabalhar em uma rádio comunitária é o contato com todo mundo”, conta. As ligações podem ser feitas durante toda a programação para pedir músicas ou ajuda. “Essas pessoas precisam da rádio. A gente acha animais, crianças perdidas, documentos, a gente não toca só música”, conclui Liberalino.

> Casos especiais

Em casos de desaparecimento na comunidade, os locutores contribuem na busca pelas vítimas por meio da cobertura do incidente. Pela forte ligação com a UNAS, a rádio também serve como porta-voz de eventos, como a Caminhada pela Paz e a Balada Sem Álcool, todos realizados na favela.

> Os voluntários

Para a maior parte dos locutores, não há nenhum tipo de remuneração pelo serviço prestado, o que os mantém trabalhando é saber que estão contribuindo para a mudança da comunidade. Diego Rocha deixa claro que “quem faz rádio comunitária, faz por amor”.

As pessoas que colaboram na rádio têm o poder de transformar a sociedade — Diego Rocha

Além disso, muitos não possuem diploma de graduação para radialismo, devido a falta de acesso e oportunidades, mas buscam especialização através de contatos dentro de universidades, como o do professor Pedro Vaz, da Universidade Anhembi Morumbi. Em 2019 , toda a equipe realizou um curso de formação na Rádio Oficina, em São Paulo, como nos conta Cida Lourenço, a voz que comanda o programa Nas Quebradas do Nordeste. Hoje, Cida e os outros já possuem certificados de comunicadores, mas deixam claro que os conhecimentos teóricos não podem tirar o brilho nos olhos de fazer rádio.

O texto acima é parte de um trabalho acadêmico chamado ‘LADO B — Heliópolis’, uma revista voltada para a comunidade e colocando a mesma em evidência, valorizando e mostrando o lado que a maioria das mídias não procuram relatar. Este texto contém pequenas alterações do texto original. Originalmente produzido em conjunto com o jornalista Lucas Campelo.

A revista é obra dos seguintes jornalistas: Amanda Alves, Amanda Schnaider, Bruna Zanin, Bruno Santana, Erick Astolpho, Guilherme Assumpção, Izabella Macedo, Jefferson Campel, João Loures, João Machado, Jonas Kauffman, Laura Castro, Lucas Campelo, Luciano Massi, Maria Morato, Mariana Checoni, Tallyta Pavan e Thamyres Kasperavicius

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Tallyta Pavan

Jornalista. 22 anos. Me encontro nas entrelinhas daqueles que poetizam sobre a vida e acredito na prática de ubuntu.